sábado, 1 de maio de 2010

Eu Sou (Clarice Lispector)

Para me refazer e te refazer volto ao meu estado
de jardim e sombra fresca realidade,
mal existo e se existo é com delicado cuidado.
Em redor da sombra faz calor de um suor abundante.
Estou viva. Mas sinto que ainda não alcancei os
meus limites, fronteiras com o que?
Sem fronteiras, a aventura da liberdade perigosa.
Mas arrisco, vivo arriscando.
Estou cheia de acácias balançando amarelas,
e eu que mal e mal comecei minha jornada,
começo-a com um censo de tragédia adivinhando
para que oceano perdido vão meus passos de vida.
E doidamente apodero dos desvãos de mim,
meus desvarios me sufocam de tanta beleza.
Eu sou antes, eu sou quase, eu sou nunca.

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