segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Dormi contigo (Pablo Neruda)



Dormi contigo a noite inteira junto do mar, na ilha. 
Selvagem e doce eras entre o prazer e o sono, 
entre o fogo e a água. 
Talvez bem tarde nossos 
sonos se uniram na altura e no fundo,
em cima como ramos que um mesmo vento move,
embaixo como raízes vermelhas que se tocam. 
Talvez teu sono se separou do meu e pelo mar escuro
me procurava como antes, quando nem existias,
quando sem te enxergar naveguei a teu lado 
e teus olhos buscavam o que agora - pão, 
vinho, amor e cólera - te dou, cheias as mãos, 
porque tu és a taça que só esperava 
os dons da minha vida.
Dormi junto contigo a noite inteira, 
enquanto a escura terra gira com vivos e com mortos, 
de repente desperto e no meio da sombra meu braço
rodeava tua cintura. 
Nem a noite nem o sonho puderam separar-nos.
Dormi contigo, amor, despertei, e tua boca 
saída de teu sono me deu o sabor da terra,
de água-marinha, de algas, de tua íntima vida, 
e recebi teu beijo molhado pela aurora 

como se me chegasse do mar que nos rodeia.


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